De facto, eu concordo com tudo o que foi dito pelo Pankas. A análise clara e exaustiva dos espaços culturais existentes na cidade não deixa margem para dúvidas: os políticos locais não querem apoiar a cultura, querem é acabar com ela. Porquê? Bem isso é outra questão que nos daria certamente pano para mangas...
Em todo o caso, só não concordará com esta leitura quem realmente não quiser ver os factos - quem tiver dúvidas, eu sugiro que venha passar uns dias connosco (com a companhia de teatro Encerrado para Obras).
Será bem-vindo e poderá ver com os seus próprios olhos em que condições nós trabalhamos árdua e alegremente apesar das precariedades. Só para que fiquem minimamente esclarecidos, eis uma súmula do nosso historial:
A companhia foi criada por 3 profissionais de teatro em 1995, tendo desde então criado 22 produções de teatro e música. Nos primeiros anos, a actividade da companhia não era permanente, as pessoas eram todas profissionais das artes do espectáculo mas como não havia meios na Encerrado para Obras, éramos obrigados a trabalhar com outros projectos, mesmo com aqueles que eram para nós altamente questionáveis. Da equipa inicial, só resto eu próprio, os outros procuraram outras paragens. A verdade é que graças a um trabalho intenso na área da produção, e também graças a um apoio financeiro do MC para a nossa actividade anual em 2002, foi possível fixar um estrutura de 3 elementos (eu próprio, a Estela Lopes e a Marta Alves), estrutura que se mantém activa em permanência desde então - o ideal seria sermos pelo menos mais 2 ou 3 mas até a ver não houve condições financeiras porque recursos humanos talentosos e dedicados não têm faltado. Para além dos permanentes, todos os anos temos contratado pontualmente cerca de uma dezena de colaboradores em diversas áreas.
Nos últimos anos temos feito uma média de 90 apresentações por ano
(109 em 2006). Quem se dignou a ir ver as nossas últimas produções no
Museu de Física (Eureka em 2005 e Physicomic em 2006) ficou agradavelmente surpreendido com a qualidade do nosso trabalho, e na verdade apesar do público em geral que tem ido ver os nossos espectáculos ser bastante reduzido (até colegas de trabalho é raro aparecerem) este tem vindo a crescer substancialmente. E este facto deve-se, estamos certos, à qualidade das propostas. À divulgação, escassa porque o dinheiro também escasseia, não será certamente. À excelência das infra-estruturas também não é com certeza, se estamos a trabalhar no Museu de Física (um espaço exíguo para a apresentação de espectáculos, mas em que apesar de tudo conseguimos criar espectáculos de qualidade que muito agradaram ao público de todas as idades, um espaço que não possui sala de espectáculos mas em que apesar de tudo temos muito mais público do que tínhamos no Inatel), pois se estamos a trabalhar neste espaço é tão-somente porque eles nos convidaram para tal, abriram-nos as portas quando todos os outros não quiseram saber, acreditaram e empenharam-se desde logo no nosso projecto. E pelos vistos, foi uma aposta ganha, pois o número de visitantes do Museu mais que triplicou no espaço de alguns meses.
É engraçado constatar que um dos projectos que acima referi, o espectáculo "Eureka" não obteve apoio do MC sob pretexto de que o espaço (O Anfiteatro do Museu de Física) não oferecia condições. A verdade é que apesar da falta de apoio o projecto foi em frente, e foi um sucesso, tendo feito desde Novembro 2005, 82 apresentações (em
Coimbra e em muitos outros locais do país, chegando mesmo a passar pelos Açores) e como muitos outros projectos do grupo, o espectáculo continua em carteira.
Enfim poderia contar muitos outros casos destes, até porque em 2006, vimos novamente negado apoio a dois dos nossos projectos pelo MC, e mais uma vez com argumentos completamente absurdos, quando outros projectos de grupos compostos essencialmente por pessoas que não sededicam profissionalmente à actividade artística, ou pelo menos que não a desenvolvem de forma exclusiva, esses sim são apoiados. Se esses projectos mostrassem verdadeiro dinamismo, eu calava-me e não vinha para aqui falar disto, mas depois é o que se vê, recebem subsídios chorudos, apresentam meia-dúzia de espectáculos e arrumam os trapos...
Irão apontar-me que divago muito, que isto já parece um testamento, e que afinal de contas isto não é para aqui chamado, mas infelizmente tem tudo a ver, pois mais uma vez, se somos confrontados com uma situação deste tipo, isso tem tudo a ver com Coimbra – indirectamente tem a ver com a apatia das forças vivas desta cidade, que promove não o encontro entre as pessoas, não a união por causas comuns, mas antes o secretismo, o compadrio, o individualismo; e directamente tem tudo a ver com Coimbra porque resulta precisamente de uma situação de compadrio (apesar de ser uma decisão do MC, bem sabemos que essa decisão foi tomada cá em Coimbra, e se não conheces verdadeiramente os projectos porque nunca sequer te dignaste a ir ver, sabes como é, o apoio vai para os amigos...). É assim nesta pequena aldeia que é Coimbra. O Zeca já muito falava do provincianismo do lugar...
E no fim disto tudo, com os dados estatísticos que estamos fartos de enviar tanto para a Câmara como para a comunicação social, vem o
Encarnação arrogando-se o direito, quando confrontado com as dívidas da CMC aos agentes culturais, de afirmar que a Encerrado para Obras não é profissional. Falta de profissionalismo é certamente a dele, das duas uma, ou por não conhecer as realidades da cidade que governa, ou porque realmente tem um agenda escondida onde estão estipulados outros objectivos, que passam não pelo apoio à arte, mas sim pela sua asfixia. E quando as coisas se começam a asfixiar a si próprias então aí as coisas podem estar mesmo perdidas.
Se o estão ou não, não sei, mas pela minha parte, e posso afirmar o mesmo em relação aos restantes membros da Encerrado para Obras, diremos o que teremos a dizer sem medos. E fá-lo-emos sem guardar qualquer tipo de rancor pois é certo e sabido que isso faz mal àsaúde.
E continuaremos a trabalhar, sempre em frente, sem vacilar (enfim, atéque as pernas o permitam...). E continuaremos abertos a todo o tipo de parcerias, de colaborações, de novos encontros e novas ideias...
E por esse motivo, aproveitamos a oportunidade proporcionada por este
blog para lançarmos aqui um desafio aos agentes culturais desta cidade: para quando a criação de um movimento sério de contestação à política (ou falta dela) da CMC para a área cultural? Enfim não é nada de novo mas também nunca é demais insistir nestas coisas. Nós estamos prontos para a luta quando quiserem, sabemos que juntos teremos mais força e todos os meios de contestação, desde que pacíficos são válidos, o que interessa é desassossegar não é?
P.S. No próximo sábado 3 de Março, pelas 16h30 estreamos nova produção
- Chama-se "Sol e Lóquio", e estará em cena em Março numa tenda montada no Pátio do Departamento de Ciências da Terra (a entrada para o espectáculo é junto à porta da Sé-Nova, 1ª porta à direita). Para o público em geral é sempre aos sábados, pelas 16h30. Estão todos convidados a aparecer, para além de assistirem ao espectáculo, poderemos falar das possíveis formas de luta, e também das possíveis formas de festa... Enfim, apareçam, ficaremos bem contentes, e pensamos que também gostarão.
Um abraço fraterno para todos,
David Cruz (Encerrado para Obras)
P.S.nº2. Encerrado para Obras, mas aberto ao público, como sempre...
(Fotos TATI)